Instituto Histórico IMPHIC - Betim

"Sapio ut Protegam, Protego ut Praeservam"

Localização: Av. Governador Valadares esquina com a Rua Antônio Rafael, Centro – Betim – MG.

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O abastecimento de água em Betim passa por vários momentos, cada um deles inerente à sua época e “tecnologia” disponível. O poder público, fator principal nesta questão, deve ser levado em consideração por impor, em determinado momento histórico, uma nova fase no abastecimento municipal, efetivando, dessa forma, sua função pública nesta área. Neste sentido, ao propor um estudo sobre a “caixa d’água” (situada na Av. Governador Valadares, próximo à Praça Milton Campos) tende-se a uma pesquisa histórica que aborda, essencialmente, noções de urbanismo e políticas públicas em Betim.

A água, na fase originária de Betim, início do século XVIII, era extraída através de minas d’água (ou olhos d’água, termo popular). Havia ainda os igarapés e riachos que também são considerados fontes de abastecimento da época. Todavia, a Betim do século XVIII, ou Capela Nova, não possuía uma mina em sua porção central, o Largo da Matriz, atual Praça Milton Campos. Uma das minas mais tradicionais da cidade, e também a que a abastecia naquele momento: a “Bica da Cacimba”, ou Praça da Cacimba, nomenclaturas contemporâneas. A cidade, durante os séculos XVIII e XIX e uma parte da primeira metade do século XX, utilizou do abastecimento desta mina e de outras menores. É necessário enfatizar, que a parte central de Betim (nos séculos XVIII e XIX) estava limitada ao Largo da Matriz, estando a mina a uma distância de cerca de quatrocentos metros.Outras regiões de Betim, que evoluíram a partir da segunda metade do século XVIII, como os bairros Angola e Decamão (os mais próximos), utilizavam o Riacho Betim, pela proximidade e também de minas d’água. No caso da parte central, devido à distância, a água era levada em recipientes para as casas, em sua maioria, pelos escravos, que entre outras tarefas, realizavam as de caráter doméstico.

A medida que a cidade cresce e evolui, o sistema de abastecimento tende a acompanhar tal movimento. A partir da segunda metade do século XIX, começam a surgir nos quintais das casas as cisternas: poços escavados verticalmente no solo, até atingir um lençol d’água. Assim, a caminhada até a mina não era mais tão comum. Todavia, aquela mina ainda seria usada por um considerável período, pois muitas famílias não eram possuidoras de recursos para a construção de uma cisterna nos quintais de suas casas – considerando a presença do escravo em Betim, que com a abolição passa a constituir uma família livre. Outras famílias não tinham condições por serem de lavradores empregados ou jornaleiros, o que sugere seu caráter simplório. Esta população menos abastada, forma uma parte considerável, senão, a maior da sociedade betinense do período em questão.

O século XX para Betim, especificamente a década de 1940, marca um fato importante: o abastecimento domiciliar d’água, feito através de um órgão público, a prefeitura. O ano de 1940 é o primeiro ano em que o município existe enquanto tal, ou seja, é o primeiro em que o Betim comemora um ano de emancipação política. O período que compreende os anos finais do século XIX e inicio do XX, marca, no país, um movimento acelerado de urbanização. Ruas planejadas e largas, energia elétrica, industrialização e água encanada (dentro de uma política de saneamento básico) são pontos gerais tratados neste momento pelo poder público. Em Betim, em 1940, como uma de suas pautas de urbanização, o poder público investe no abastecimento domiciliar d’água, baseado num sistema de poços artesianos, que tinha sua água levada, encanada, até os lares. O fato desta prestação de serviço público ser taxada, exclui ainda muitas famílias sem recursos e estes, por sua vez, permanecem usufruindo do modo “tradicional”, as minas. Este sistema de abastecimento perdura na cidade por duas décadas, as de 1940 e 1950.

A década de 1960 marca uma nova fase no abastecimento, uma vez que a prefeitura percebe a evolução da cidade durante as duas décadas anteriores e resolve um novo investimento, numa “modernização” do sistema. Em 1962 é inaugurado um sistema baseado em reservatórios e caixas-depósitos d’água, com encanamento destas para as casas. A captação d’água era feita através de bombas (elétricas ou a combustível) que extraiam a água dos poços artesianos e riachos para os reservatórios e caixas-depósitos. A primeira e a principal caixa-depósito (ou “caixa d’água”), tratada neste histórico, está situada próximo ao local de origem da cidade, a Praça Milton Campos. Ao mesmo tempo em que simboliza um marco na história do abastecimento e urbanismo de Betim, a caixa d’água marca também o momento (1967) em que a prefeitura transfere a obrigação deste serviço público para uma estatal mineira, a COMAG – Companhia Mineira de Águas e Esgotos. A partir de então, é o estado o responsável direto pela água domiciliar. Na década de 1970, é criada a COPASA, outro órgão estatal, que além de promover o abastecimento domiciliar, passa a tratar a água que chega aos lares, num sistema integrado. A caixa d’água, então, passa aos cuidados deste órgão, que o gere até os dias atuais. Em meados da década de 1980 ocorreu o seu desativamento definitivo, em função da implementação de um novo sistema de abastecimento.

O abastecimento domiciliar está diretamente ligado a questão urbana das cidades, que tende a se agravar com a industrialização que, por sua vez, fere os recursos naturais. Neste sentido, a história sobre a caixa d’água aborda desde questões como urbanismo e políticas públicas, até as de caráter ambiental e industrial, incutidas num contexto histórico extenso e complexo, produzido pela evolução de Betim. Em resumo, o estudo sobre o abastecimento da água nesta cidade desperta a atenção para um problema atual: água, recurso natural finito.


Anos 1960: início da ascensão urbana de Betim.
A construção da caixa d’água, exposta neste dossiê de tombamento, ocorreu em função de um considerável crescimento da região urbana betinense, registrada a partir dos anos 1960. Uma parte considerável dessa evolução urbana se deve, sobremaneira, ao fator “migração”, que neste caso e período específicos, ocorreu de duas formas: migração da população da zona rural para a urbana; migração de uma população não natural , ou seja, exógena à cidade. É necessário salientar que essa movimentação populacional foi instigada pela construção da Rodovia Fernão Dias, inaugurada, em Minas Gerais, em 1959. Dessa forma, tem-se a Fernão Dias como um dos principais fatores geradores da “urbanidade” betinense, induzindo a administração pública local, a ações de adequação àquela nova realidade.

A Rodovia Fernão Dias, construída no governo do então presidente Juscelino kubistchek, assume relevância no processo histórico em questão, por ter provocado um considerável número de loteamentos na porção central da cidade, durante a década de 1960. Algumas famílias, que já possuíam grandes áreas na região em volta da Praça Milton Campos (antigo Largo da Matriz) e na extensão da Av. Governador Valadares, promoveram a repartição dessas áreas com a finalidade de trazerem os familiares do campo para a “cidade”, ou para vender os lotes à terceiros. Já outras, que habitavam no meio rural, compravam terrenos próximos ao centro, ou na extensão da Rodovia, para praticarem o loteamento e se mudarem para o meio urbano. O relato de D. Dica, moradora da região central, serve como um exemplo para este último caso: “Meu sogro na época comprou aqui e veio pra Betim. Betim tinha melhorado muito e ele veio do campo para Betim...na época de 60”.

Este movimento migratório é o segundo que ocorreu no município; antes, por volta de 1910, a cidade desenvolveu um novo desenho urbano em função da passagem da linha férrea, que se instalou a aproximadamente uns setecentos metros da parte posterior da Praça Milton Campos – até então tida como região central. É comum no meio popular a afirmativa de que “a cidade cresceu para trás, nas costas da Igreja [antiga Matriz onde hoje está a Praça Milton Campos ]”. O que se nota, dessa forma, é uma formação urbana que desloca o eixo central da cidade para a confluência das avenidas Governador Valadares e Amazonas, em detrimento ao “antigo” centro, na Praça. Este momento histórico que envolve o período de 1910, trouxe uma inédita dinâmica sócio-urbana para o município, mas, contudo, não causou uma inversão de polaridades, sendo que a população do campo se mantém superior a da urbana; nem tão pouco, proporcionalmente, implicou em qualquer tipo de crescimento gradual desta última. Todavia, a passagem da Rodovia Fernão Dias, por sua vez, é que provocou efetivamente tal crescimento, que ocorreu de forma lenta e gradual .

A migração da população exógena à cidade, foi, por sua vez, a principal responsável pelo desenvolvimento urbano. Muitos foram os trabalhadores que vieram com suas famílias para as obras de pavimentação da Rodovia, que se estendeu por quase toda a década de 1960. Vários foram os imobiliários que realizaram comércio de lotes neste período. Um dos maiores exemplos desta ação, foi o loteamento do bairro P.T.B. – nome popular que se oficializou, sendo que suas siglas significam, “Posto Telegráfico de Betim”, por existir na linha férrea, que passa em frente ao bairro, tal posto. Praticamente durante toda a década de 1960 houve um certo arranjo territorial, embasado nas ações de configuração dos lotes e bairros novos, sendo a maioria implantados às margens da Rodovia. A década seguinte assiste a uma migração em larga escala, acentuada pela instalação da FIAT automóveis e indústrias de autopeças para o atendimento àquela montadora . O fato é que os loteamentos feitos nos anos sessenta – sejam eles próximos ou não ao centro – foram sendo gradativamente ocupados nas décadas seguintes. Todavia, uma parte considerável dessa ocupação ocorreu de forma irregular, gerando a existência de guetos e favelas, como o “morro” do Teresópolis , situado a aproximadamente doze kilometros do centro de Betim. O que ocorreu, em determinados momentos, foi um crescimento urbano e populacional acelerado, ambos provocados pela vertiginosa industrialização em Betim, não permitindo uma ação do poder público adequada àquela situação. Neste sentido, o que se instalou na cidade foi uma realidade dividida entre o tradicionalismo, simbolizado pela Praça Milton Campos (originária do século XVIII), e o industrialismo, simbolizado pelo “complexo” Teresópolis, sendo que essas realidades têm inerentemente, sociedade e urbanismo identificadores.

A partir da década de 1960, Betim inicia uma nova configuração urbana e social, que definirá sua condição populacional como majoritariamente urbana. Neste sentido, o início dessa configuração se deu na região central, com uma migração considerável da população do campo para a cidade. Foi necessário, portanto, a criação de condições adequadas para os novos “habitantes” do centro. Coube ao poder público municipal tal incumbência, ou seja, essa criação consistiu na implantação de uma infra-estrutura básica para que a região central comportasse seus moradores. É necessário ressaltar que este tipo de migração foi deflagrado em toda Minas Gerais, o que fez com que o governo mineiro investisse em obras de infra-estrutura para a crescente indústria do estado e também da população que tendia migrar para as áreas de indústria. Uma das maiores ações do governo nesta questão foi a criação da CEMIG, para o fornecimento de energia elétrica em larga escala para indústrias e cidades, ou seja, o amparo à produção e ao mesmo tempo à sociedade urbana. Em Betim, por exemplo, uma central distribuidora de energia foi implantada em 1956 , próxima à Praça Milton Campos (centro histórico), às margens da Rodovia Fernão Dias. Este fato foi sintomático, pois três anos mais tarde, já estava prevista a inauguração da Rodovia e com ela o crescimento urbano. No início da década de 1960, a Prefeitura municipal instalou o primeiro reservatório de água para o abastecimento domiciliar; este pode ser considerado um fator do crescimento efetivo que teve o município em sua parte central. Foi uma medida considerada eficiente para o momento, porém, o fato é que nas décadas seguintes a população aumentou a proporções alarmantes, obrigando a criação de um órgão estatal, a COPASA na década de 1970, para gerenciar a questão do abastecimento d’água, transferindo, dessa maneira, esta responsabilidade do município para o estado. Este procedimento se aplicou a Betim que teve nesta década tal responsabilidade transferida para a COPASA.

O contexto histórico no qual esteve inserido a construção da primeira caixa d’água de Betim, foi o de um intenso movimento de industrialização pelo qual passou a região metropolitana de Belo Horizonte, que tem como outro exemplo próximo a cidade industrial de Contagem, construída a partir dos anos 1940 . Neste mesmo contexto, pôde ser notado uma intensa ação pública (estatal ou municipal) no sentido de “modernizar” as condições de vida da sociedade urbana. Dessa forma, o termo “moderno”, estava associado ao termo “indústria”, que estava associado ao termo “urbanização”. Neste sentido, só havia modernidade onde havia indústria, só havia urbanização onde havia indústria e, portanto, uma sociedade para ser considerada “moderna” – no referido contexto histórico – deveria ser urbana e embasada economicamente na atividade industrial. Uma sociedade para se tornar, na prática, moderna, deveria ter consigo elementos que a tirassem do “atraso” e o tema proposto neste dossiê de tombamento, o abastecimento domiciliar de água, é um desses elementos. Portanto, a sociedade “urbana” de Betim da década de 1960, teve, dentre outros, a Caixa D’Água como mais um símbolo que lhe conferia pecha de “moderna”.

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